Comentário 174
174
2021/08/18
Expulso do ventre da mãe
Entrei neste mundo
Vestido com a frágil pele,
E com um grito,
Choque do ar nos débeis pulmões.
Logo,
Nesse primeiro dia,
Vestiram-me.
Ano após ano
Com mais trapo,
Menos trapo
Desligaram-me das sensações puras
Tomadas à flor da pele.
Chega um momento
Que sinto vontade de viver,
A urgência de brincar,
O desejo de sonhar,
De seguir caminhos
Mais ou menos dolorosos.
Mais ou menos silenciosos
À procura da vida.
Só com pés nus
Possuo o caminho.
Nas pedras ásperas deixo sangue,
Leve, sigo pelo manto de musgo,
Poiso aqui e ali no areal,
Sinto-me gaivota.
Pela renda das nuvens
Olho a espuma das ondas
Que se enrola nas areias.
Dois trilhos de pés descalços,
Separados por uma sombra,
Que duas mãos unem.
Uma gargalhada límpida
Ecoa das pegadas abandonadas.
Nesse momento
Compreendo a grandeza
De ter vindo nu ao mundo.
Zé Onofre